Sabia que uma açorda alentejana pode ser Macrobiótica? Sim, é mais fácil do que parece
Eva Madeira, autora do projeto evagoodlife, esteve à conversa com a MAGG sobre Macrobiótica — que não só pode ser simples, como incluir doces —, e sobre o primeiro World Macrobiotic Summit, que acontece já este fim de semana.
Pela primeira vez a Macrobiótica vai saltar da mesa para o online numa sessão inédita. Está a chegar o World Macrobiotic Summit, acontece já este sábado e domingo, 20 e 21 de fevereiro, que vai reunir um painel de nomes distintos que estão para a Macrobiotic Summit como Paddy Cosgrave está para a Web Summit. O evento vai contar com vários debates, entre as quais o papel atual da alimentação Macrobiótica, e ainda com receitas feitas em direto e em simultâneo por mais de 2 mil pessoas inscritas — além dos organizadores do evento.
Para alguns, a Macrobiótica é uma novidade, para outros é ainda uma palavra desconhecida. Por isso, antes de se aventurar nesta reunião internacional, é essencial perceber, afinal, o que é a Macrobiótica? "A Macrobiótica é um modo de vida que nos ajuda a fazer escolhas mais conscientes no que diz respeito à alimentação, à prática física e ao estilo de vida em geral. Escolhas essas que sejam benéficas para o corpo, para a mente e para o planeta em que vivemos", explica à MAGG Eva Madeira, de 41 anos, fundadora do projeto evagoodlife e um dos membros do painel do World Macrobiotic Summit.
Ao contrário do que podíamos pensar, tal como no veganismo, a Macrobiótica (que junta as palavras gregas “macro”, grande, e “bio”, vida) não diz respeito apenas à alimentação, mas sim ao nosso estilo de vida para atingir uma vida plena. Eva, mãe de três filhos, só descobriu isto depois de tirar um curso em Publicidade e Marketing, uma formação em Programação Neurolinguistica (PNL) e depois de, a certa altura na vida, confrontar-se com um profundo sentimento de tristeza em relação ao trabalho e a consequente degradação do estado de saúde.
"Eu comecei a ficar mesmo muito doente, com uma anemia muito grande. Passava a vida sem energia e tudo me cansava, até a mais banal das tarefas domésticas. Então decidi que precisava de atuar, de fazer alguma coisa para mudar o meu estado de saúde e então, depois mudar de vida", conta à MAGG. Foi então que começou a pesquisar soluções na internet, até deparar-se com a Macrobiótica em 2015 através do Instituto Macrobiótico de Portugal, onde completou os três níveis do curso Anual de Macrobiótica e a formação em Macrobiotic Mentoring. "Resolvi de imediato começar a estudar e a aprofundar os meus conhecimentos nesta área", diz.
A Macrobiótica teve um impacto tão positivo na vida de Eva, que acabou mesmo por largar um percurso de 13 anos de trabalho como delegada de informação médica para dedicar-se a partilhar com os outros o conceito que lhe mudou a sua vida — sem nunca mais voltar à antiga profissão. "Continuo a estudar e a praticar esta arte de viver até hoje", refere.
"Arte", diz Eva sobre a Macrobiótica, mas que pode também ser vista como um dom de mudar vidas. "Ajudou na saúde de toda a minha família. A Júlia, a minha filha do meio, tinha um problema de obstipação crónico desde que tinha 1 ano e era seguida no hospital na tentativa de controlar este problema. Com a Macrobiótica, conseguimos equilibrar os seus intestinos e nunca mais tivemos que recorrer a medicamentos, clisteres, nem privações alimentares", lembra.
O que é que come um macrobiótico?
Para lá dos benefícios, o maior entrave para quem quer aventurar-se no mundo da Macrobiótica pode ter que ver com o que cozinhar. Não faltam exemplos no canal de YouTube de Eva Madeira, no qual mostra que a Macrobiótica é feita de sabor e, acima de tudo, que é fácil.
"O que é desafiante é a mudança de padrão. É quebrar com crenças e práticas de uma vida inteira. É perceber que é possível fazermos refeições equilibradas com base em cereais integrais, vegetais, leguminosas, sem recorrermos a produtos animais, pelo menos numa base diária. Depois disso é mesmo muito simples e tendo o conhecimento e as ferramentas que aprendemos com a filosofia macrobiótica, conseguimos realizar refeições realmente equilibradas e deliciosas, em qualquer lugar e altura", explica Eva à MAGG. O World Macrobiotic Summit vem reforçar o acesso a estes conhecimentos, mas há muito que têm sido ensinados pela autora do projeto evagoodlife que, da própria experiência a ensinar e partilhar dicas, tem assistido a transformações inéditas.
"Conheço muitas pessoas que não gostavam de cozinhar e que passaram a adorar desde que conheceram a Macrobiótica", conta. Por isso, se em casa nunca consegue livrar-se da cozinha, pode ter aqui a oportunidade perfeita para passar o testemunho ou passar a partilhar momentos de partilha junto ao fogão.
E ao contrário do que pensa, pode até já estar a praticar uma alimentação Macrobiótica no seu dia a dia sem o saber. "Cada vez que optamos por legumes e frutas da época e locais, cada vez que damos preferência a produtos orgânicos sem químicos, estamos a ter uma atitude alinhada com esta filosofia de vida", explica Eva.
É certo que há muito mais a explorar, no entanto, a base da alimentação não é complexa, segundo a especialista em Macrobiótica. "Se pensarmos que a alimentação padrão Macrobiótica assenta em cereais integrais, vegetais, leguminosas e algum peixe (sem ser de aquicultura), facilmente encontramos nas cozinhas mais tradicionais uma açorda alentejana, por exemplo, com pão de fermentação natural que inclui os cereais, uma pequena porção de bacalhau que pode ser acompanhada com uns grelos ou couves escaldadas. Uma bela sopa de feijão e couves, muitas vezes com massas que podem ser integrais, etc", exemplifica.
Fora estes exemplos, há pratos mais familiares para quem está num nível médio a avançado na Macrobiótica, como um estufado de feijão azuki ou panados de seitan. Se é guloso, nada tema, porque também para Eva doces não podem fugir do vocabulário ligado à "alimentação".
"Se houvesse um estilo de vida em que não se pudessem comer doces, esse não seria de todo o meu estilo de vida", brinca e avança com uma explicação sobre como estes se inserem na Macrobiótica. "O sabor doce é fundamental para o equilíbrio, bem como o sabor salgado, o ácido, o amargo, o picante. O importante é escolher um doce de qualidade e que não comprometa seriamente a nossa saúde", refere. Devem assim ser excluídos aqueles que incluem alimentos processados, açúcares refinados e lacticínios. Assim, apenas com alimentos naturais pode conseguir receitas como um crumble de maçã ou brownies.
"Na Macrobiótica não existem proibições"
A Macrobiótica não é uma novidade na alimentação e há muito tempo que começou a ser usada para curar doenças, incluindo doenças graves. Talvez por essa mesma razão, começou a ser associada apenas a pessoas doentes, afastando o verdadeiro conceito: viver de forma plena, nutrindo de dentro para para fora.
"Acredito que a Macrobiótica ficou associada a uma prática um pouco rígida e desinteressante, porque no início da sua divulgação era maioritariamente seguida por pessoas doentes", afirma Eva Madeira, que defende precisamente o contrário. "Para mim a Macrobiótica é o contrário de rigidez e pode ser muito flexível, dependendo claro do nosso estado de saúde. Na minha visão, na Macrobiótica não existem proibições, existem sim escolhas mais ou menos adequadas à nossa condição", acrescenta.
Pode parecer que o conceito foi desvanecendo ao longo dos anos, talvez pela emergência do vegetariano e veganismo como forma urgente de combater as alterações climáticas, mas para a autora da evagoodlife, a Macrobiótica, que também contribui para um menor impacto ambiental, está igualmente a ganhar força.
"Vejo cada vez mais pessoas a interessarem-se por esta filosofia de vida. Acredito que estamos num ponto de viragem e que existe uma procura genuína de novas formas de estar na vida e a Macrobiótica pode ser a resposta que muitas pessoas procuram" e que poderão encontrar no World Macrobiotic Summit.